A urticária do poder

Alegam eles que, na verdade, houve apenas uma correção no valor venal dos imóveis. Pressupomos, portanto, que os valores anteriores estavam distorcidos, desatualizados. O contribuinte, então, deve ficar tranqüilo, porque o que o Executivo fez foi simplesmente distorcer o que estava torcido. O governo municipal somente restabeleceu a justiça fiscal, defendeu o interesse público e se esforçou em ampliar as fontes de receita para garantir mais realizações em favor de todos.
É uma cômoda interpretação da verdade, uma vez que despreza flagrantemente o fato - simples mas absoluto - de que o contribuinte terá de desembolsar, em muitos casos, o dobro do que pagava em anos anteriores. O que lhe importa se a planta de imóveis estava ultrapassada? A verdade - inconteste - é que o valor foi majorado num índice absurdamente espoliativo. Nenhum contribuinte piçarrense certamente viu seu patrimônio ou sua renda pessoal multiplicar de tal forma no período de um ano.
Mas não bastasse a horrenda meia-verdade, a falta de diálogo com o contribuinte, com a sociedade que sustenta a máquina pública, causa idêntica irritação. Outrora, quando vigoravam versões diversas do coronelismo, a sociedade engolia o suspeitíssimo fato de que o prefeito, sozinho, deveria deliberar sobre o futuro da cidade. Hoje, prefeito que insiste na prática megalomaníaca, dá prova de interesse escuso ou de aversão à democracia. Tem urticária só em pensar que terá de dividir com o povo o poder que ele bancou quase sozinho para desfrutar. Seria mesmo algo injusto, convenhamos...
Comentários